segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Não deixe que a saudade sufoque, que a rotina acomode, que o medo impeça de tentar. Desconfie do destino e acredite em você. Gaste mais horas realizando que sonhando, fazendo que planejando, vivendo que esperando, porque, embora quem quase morre esteja vivo, quem quase vive já morreu. (Luiz Fernando Veríssimo)

Quando a gente pensa que sabe todas as respostas, vem a vida e muda todas as perguntas.

Não é digno de saborear o mel, aquele que se afasta da colméia com medo das picadas das abelhas

Não acrescente dias a sua vida, mas vida aos seus dias.

Sábio é aquele que conhece os limites da própria ignorância.

sábado, 24 de setembro de 2011

VI

Busque Amor novas artes, novo engenho
Para matar-me, e novas esquivanças,
Que não pode tirar-me as esperanças,
Pois mal me tirara o que eu não tenho.

Olhai de que esperanças me mantenho!
Vede que perigosas seguranças!
Pois não temo contrastes nem mudanças,
Andando em bravo mar, perdido o lenho.

Mas, conquanto não pode haver desgosto
Onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê.

Que dias há que na alma me tem posto
Um não sei quê, que nasce não sei onde,
Vem não sei como, e dói não sei porquê.

- Camões (Sonetos para amar o amor)

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

O par que me parece (Paulo Leminski)

Pesa dentro de mim
o idioma que não fiz,
aquela língua sem fim
feita de ais e de aquis.
Era uma língua bonita,
música, mais que palavra,
alguma coisa de hitita,
praia do mar de Java.
Um idioma perfeito,
quase não tinha objeto.
Pronomes do caso reto,
nunca acabavam sujeitos.
Tudo era seu múltiplo,
verbo, triplo, prolixo.
Gritos eram os únicos.
O resto, ia pro lixo.
Dois leões em cada pardo,
dois saltos em cada pulo,
eu que só via a metade,
silêncio, está tudo duplo.

domingo, 18 de setembro de 2011

perto do osso a carne é mais gostosa

"sossegue coração
ainda não é agora
a confusão prossegue
sonhos a fora

calma calma
logo mais a gente goza
perto do osso
a carne é mais gostosa"

- P. Leminski.

quinta-feira, 30 de junho de 2011

A solidão

"DIZ-ME um jornalista filantropo que a solidão é má para o homem; e, em abono de sua tese, cita, como todos os incrédulos, palavras dos Padres da Igreja.
Eu sei que o Demônio é dado a frequentar os sítios áridos e que o Espírito do homicídio e da lubricidade se inflama prodigiosamente nos ermos. Mas talvez esta solidão só fosse um perigo para a alma ociosa e divagadoea que a povoa de suas paixões e de suas quimeras.
Certo é que um tagarela, cujo supremo prazer consiste em falar do alto de uma cátedra ou de uma tribuna, se arriscaria muito a tornar-se louco furioso na ilha de Robinson. Não exijo do meu jornalista as corajosas virtudes de Crusoé, mas peço-lhe que não incrimine os amantes da solidão e do mistério.
Há em nossas raças palradoras indivíduos que aceitariam com menor repugnância o suplício máximo, se lhes fosse permitido fazer do alto do cadafalso uma copiosa arenga, sem temer que os tambores de Santerre lhes cortassem intempestivamente a palavra.
Não os lastimo, porque adivinho que as suas efusões oratórias lhes proporcionam volúpias iguais às que outros encontram no silêncio e no recolhimento; porém os desprezo.
Desejo, antes de tudo, que o maldito jornalista me deixe divertir-me a meu gosto.
- Então o senhor não sente nunca - perguntou-me, com um tom nasal muito apostólico - a necessidade de compartir os seus prazeres?
Vejam lá o sutil invejoso! Ele sabe que eu desdenho os seus, e vem insinuar-se nos meus, o horrível desmancha-prazeres!
"A grande desgraça de não poder estar só!..." - diz algures La Bruyère, como para envergonhar os que procuram esquecer-se na multidão, temendo, sem dúvida, não se poderem suportar a si mesmos.
"Quase todas as nossas desgraças nos advêm de não termos sabido ficar em nosso quarto" - diz outro sábio, creio que Pascal, lembrando assim, na crédula do recolhimento, todos os insensatos que buscam a felicidade no movimento e numa prostituição a que eu poderia chamar fraternária, se quisesse falar a bela língua do meu século."

- BAUDELAIRE, Charles.

sábado, 11 de junho de 2011

O amor agora

Antes de qualquer divagação, é preciso frisar a importância da música de fundo necessária para que o leitor prossiga nesse pequeno texto sobre o amor: “Alma de Violinos”, por Raphael Rabello e Dino 7 Cordas. Após alguns segundos, precisamente os 20 primeiros, poderá ele enfim começar.

Desde pequeno, quando ouvia minha mãe dizer que me amava, e depois que respondia “eu também”, sempre me perguntei se aquele verbo em comum possuía de fato a mesma significação. Com meus amigos e minha primeira namorada, a questão permaneceu. Poderíamos de fato nos amar da mesma forma? Pessoas tão distintas: idades, sexo, gostos, aparências? Por que afinal utilizávamos a mesma palavra para designar o sentimento de um pelo outro se, afinal, éramos dois tão diferentes?

Poderíamos encontrar possíveis reações em comum. Uma vez ela disse: “morreria por você”. Sim, talvez me sentisse da mesma forma. Uma vontade inexplicável de estar ao seu lado, sentir seu cheiro, olhar, tocar, ter filhos. Porém, anos depois nos separamos. E o amor? Permaneceu, eu diria, mas já não era um mártir. Transformou-se? Em quê? A palavra era a mesma, o sentimento, porém, outro. Um amor saudoso? Quantos adjetivos seriam necessários para classificar as transformações e os tipos de amor?

Após a primeira desilusão amorosa, descobri que poderia amar objetos! Quão mais fácil isso me parecia! Amar um dia bonito, um céu azul, um vento gostoso... coisas que me pareciam estar sempre lá. Ah! Como seria feliz para sempre! Ficava horas a conversar com o mar. Tocava-o, mergulhava em suas ondas, flutuava e boiava, deixando-me levar com a maré. Seria aquele amor todo diferente do meu amor ao meu querido e velho pai; ou daquele ao meu caro professor do ensino primário que me ensinou a ler todos os poemas apaixonantes, ou até mesmo daquele à Oxum, madrinha de Candomblé? Sim, sentia que sim. Porém, até que ponto era possível distingui-los ou assimilá-los?

Não inventei a palavra e nem pretendo extingui-la. À quantas significações, pressões e desigualdades ela se remete! Conforta-me apenas saber que é possível abordá-la em diferentes situações e para objetos distintos. Quando pensei em escrever esse pequeno texto, era agonizante a necessidade de descrever cada reação, emoção e pensamento que as múltiplas utilizações de “amor” me provocavam.

Agora, resta perguntar: o amor é um apenas e em constante metamorfose? Existiriam diferentes amores mutantes? Ou seria um amor único com sucessivas ramificações e pequenas classificações adjetivais? Seja como for, sinto que um amor nos basta: aquele que nos abate e nos paralisa. Podem ser vários, em diferentes momentos. No presente, aquele que me apodera repetidamente, três minutos e oito segundos vezes o infinito, é aquele à essa música-inspiração do texto. Ela não possui a palavra amor em seu nome, e uma letra muito menos. Um som de dois violões pode provocar algo que eu chamaria de amor. Amor à música? Isso já não sei. Ao ouvi-la são tantos pensamentos... Pessoas passam pela memória: as que já se foram, as que estão e as que virão um dia. A natureza, claro, aqui ao lado: o pôr do sol está bonito como nunca. Até que ponto a música não o deixa ainda mais assim? Até que ponto ela não evoca sensações misteriosas e prazerosas que posso arriscar chamar de amor? Um amor a mim também seria possível colocar nessa lista. Será talvez um simples amor às notas e à harmonia sofisticada de dois mestres da música popular? As sensações a cada um desses pensamentos se enlaçam, se cruzam e entrecruzam, de forma que amo tudo e todos ao mesmo tempo. Assim, prefiro aproveitar esses meros três minutos e oito segundos para presenciar aquilo que gostaria que durasse para sempre.


-feito hoje, 11 de junho, ao pôr do sol.

domingo, 13 de março de 2011

466.

"O homem não deve poder ver sua própria cara. Isso é o que há de mais terrível. A Natureza deu-lhe o dom de não a poder ver, assim como de não poder fitar os seus próprios olhos.
Só na água dos rios e dos lagos ele podia fitar seu rosto. E a postura, mesmo, que tinha de tomar, era simbólica. Tinha de se curvar, de se baixar para cometer a ignomínia de se ver.
O criador do espelho envenenou a alma humana."
- Fernando Pessoa

quarta-feira, 9 de março de 2011

Quarta-feira de cinzas....

Sem ilusão - Elton Medeiros

"No carnaval não vou querer me fantasiar
não vou querer me vestir de rei
não quero mais colorir a dor
e se alguém quiser me aplaudir
vai ter que ser assim como eu sou
não quer dizer q não vou nem brincar
só não quero é enganar o meu coração

No carnaval não vou mais sair fingindo
que passo a minha vida inteira a cantar
eu vou me divertir, na certa eu vou sambar
mas dessa vez a ilusão não vai me pegar

No carnaval eu sempre saí sorrindo
me divertindo só pra desabafar
três dias pra sorrir, um ano pra chorar
mas dessa vez a ilusão não vai me pegar"

sexta-feira, 4 de março de 2011

"(...) Pareceu-lhe que o espelho baço e escurecido não refletia imagem alguma. Sumira por acaso a sua existência física? Logo depois passou a ilusão e enxergou a cara toda deformada pelo espelho ordinário, o nariz tornado enorme como o de um palhaço de nariz de papelão. Olhou-se e levemente pensou: tão jovem e já com ferrugem."
C.L - A Hora da Estrela

Não entender

"Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, do modo como falo, é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter locura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo."
- Clarice Lispector

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

EMBRIAGAI-VOS

"É NECESSÁRIO estar sempre bêbedo. Tudo se reduz a isso; eis o único problema. Para não sentirdes o fardo horrível do Tempo, que vos abate e vos faz pender para a terra, é preciso que vos embriagueis sem cessar
Mas - de quê? De vinho, de poesia ou de virtude, como achardes melhor. Contando que vos embriagueis.
E, se algumas vezes, nos degraus de um palácio, na verde relva de um fosso, na desolada solidão do vosso quarto, despertardes, com a embriaguez já atenuada ou desaparecida, perguntai ao vento, à vaga, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo o que foge, a tudo o que geme, a tudo o que rola, a tudo o que canta, a tudo o que fala, perguntai-lhes que horas são; e o vento, e a vaga, e a estrela, e o pássaro, e o relógio, hão de vos responder:
- É a hora da embriaguez! Para não serdes os martirizados escravos do Tempo, embriagai-vos; embriagai-vos sem tréguas! De vinho, de poesia ou de virtude, como achardes melhor."

BAUDELAIRE, Charles.

Final sem fim......

Engraçado entrar aqui depois de mais de um ano, reler todos os posts, e ver como mudei. Não mudei de gosto. Todos os poemas e músicas que aqui postei ainda moram no meu coração. Mas o jeito de expressão é diferente. O jeito de sentir as coisas....
Engraçado também reler o texto do último post e ver como um fim também se encontra presente. Não lembro o contexto do último. O de agora é forte. Penso que talvez eles sempre estejam presentes. Estamos o tempo todo terminando coisas e, de uma certa forma, criando também.
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Que bom!!!!